Com cerca de 200 voluntários e aproximadamente 500 pessoas atendidas, o Poder Judiciário estadual, a Justiça Federal, a Defensoria Pública e dezenas de parceiros – entre secretarias estaduais e municipais, órgãos federais e entidades da sociedade civil organizada – realizaram nesta sexta-feira, 9, o primeiro mutirão PopRuaJud do Maranhão e da região Nordeste, oferecendo diversos serviços e políticas públicas para a população em situação de rua na capital.
O mutirão é uma iniciativa do Comitê Regional PopRuaJud do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Maranhão, criado para discutir a gestão, implementação e aperfeiçoamento da Política Nacional de Atenção a Pessoas em Situação de Rua (Resolução N° 425/2021) em âmbito estadual, coordenado pelos juízes Douglas de Melo Martins (juiz estadual), Jorge Ferraz de Oliveira Junior e Rafael Lima Costa (juízes federais) e pela defensora pública Clarice Binda, titular do núcleo direitos humanos. “A Defensoria pública está aqui com defensores, assessores, estagiários e servidores para atender as pessoas em situação de rua, seja por conta de documentação, auxílios, moradia, abrigo, enfim, a gente está aqui para fazer o atendimento integral às pessoas” afirmou a defensora.
O evento disponibilizou às pessoas em situação de rua serviços de saúde – médicos, psicológicos, odontológicos, testes rápidos, vacinação, serviços de higiene; de cidadania – emissão de documentação civil como certidão de nascimento e RG; CadÚnico; Auxílio Brasil; cadastro habitacional; análise e deferimento de benefícios previdenciários, peticionamento judicial, entre outros.
Participaram da ação o conselheiro Mario Maia (CNJ), presidente da Comissão de Políticas Sociais e de Desenvolvimento do Cidadão; o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Fonseca, coordenador do Comitê Nacional PopRuaJud; o presidente do TJMA, desembargador Paulo Velten Pereira; os juízes Marcio Barbosa Maia, Luciana Ortiz Tavares, Elbia Rosane de Araújo e Fábio Francisco Esteves, membros do Comitê Nacional PopRuaJud; o presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA), juiz Holídice Barros; o diretor da Corregedoria Geral da Justiça, juiz José Jorge Figueiredo dos Anjos Junior; o defensor público geral Gabriel Furtado; além de outros juízes, juízas, defensores(as), servidores, servidoras públicos e voluntários (as). A ação contou com o apoio da Associação das Defensoras e dos Defensores Públicos do Estado do Maranhão (ADPEMA), presidida pelo defensor público Cristiano Matos de Santana, presente ao evento.
O ministro Reynaldo Fonseca, coordenador do Comitê Nacional PopRuaJud, ressaltou que a iniciativa busca a concretização de uma sociedade livre, justa, solidária e fraterna, considerando que o Brasil registra mais de 25 milhões de pessoas sem habitação, 35 milhões sem água potável e mais de 100 milhões sem saneamento básico, contrariando o que prevê a Constituição Federal ao garantir a todos o direito de cidadania. “Este não é um ato de caridade, mas o cumprimento de nosso dever enquanto sociedade, uma iniciativa que deve se tornar cotidiana pois caso contrário nenhum de nós será feliz, o direito à felicidade é de todos e a Constituição garante a todos e todas o direito a políticas públicas”, avaliou.
O presidente do TJMA, desembargador Paulo Velten reafirmou o compromisso do Judiciário com as pessoas em situação de rua. “Aqui se concretizam ações voltadas para a pessoa humana nessa condição de vulnerabilidade, para a mulher, para o negro, para a negra, para a criança, para aquele que tem deficiência, enfim, para todas essas pessoas que precisam de um olhar mais humanizado do Poder Judiciário. Esse, portanto, é o nosso desafio”, frisou o presidente.
O juiz Douglas de Melo Martins, membro do Comitê PopRuaJud a nível estadual, pontuou a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça com a edição da Resolução Nº 425/2021 reconhecendo a situação de violação de direitos humanos a que estão submetidas as pessoas em situação de rua. “O Poder Público tem o papel de buscar mudar a realidade de exclusão social e ampliar a inclusão e cidadania”, observou.
O juiz federal Rafael Lima Costa, membro do Comitê PopRuaJud a nível estadual, avaliou que o mutirão de atendimento é importante não apenas por oferecer os serviços de saúde, assistência social e acolhimento às pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social e precisam ser vistas pelo Poder Público, mas também por proporcionar a articulação do trabalho em rede entre órgãos federais, estaduais, municipais e sociedade civil. “O mutirão foi um sucesso pela quantidade de atendimentos e pela aproximação institucional que permite que a política permaneça e outros eventos sejam organizados”, frisou.
A magistrada Luciana Ortiz, que atua no Comitê PopRuaJud Nacional, ressalta que o Brasil é o segundo país com maior desigualdade social entre os membros do G20, um problema que é de toda a sociedade e cabe aos poderes públicos promover políticas de inclusão, tendo o Poder Judiciário um papel fundamental como garantidor de direitos e de promover a rede interinstitucional que permite destinar serviços para que as pessoas possam exercer seus direitos e tenham acesso à Justiça. “O Maranhão realizou um evento exemplar e demonstrou como a rede deve funcionar, é fundamental que o sistema de justiça e toda a rede de assistência social sejam capazes de fazer essa integração não apenas em mutirão mas no trabalho diário com um atendimento humanizado e desburocratizado”, observou.
Há 22 anos em situação de rua, o técnico em eletromecânica Moisés Silva Macedo, de 42 anos, ressaltou a importância dos serviços públicos e atendimentos especializados, como o CentroPop e o CRAS para pessoas que, assim como ele, estão sem moradia. “Estava há dois anos sem meu RG, e hoje pude emitir minha documentação gratuitamente e receber outros serviços, pois passamos por dificuldades e falta de condições para pagar”, avaliou.
A vice-presidente nacional do “Movimento Vidas Idosas Importam”, Katy Anne Silva, pontuou que o mutirão permitiu a resolução de várias demandas das pessoas em situação de rua relacionadas com o Poder Judiciário e outras instituições por concentrar os serviços em um mesmo local. “Aqui também pudemos catalogar informações sobre pessoas idosas em situação de rua, que é uma dificuldade por não existir um cadastro específico sobre esse público”, destacou.
“O evento superou as expectativas e tivemos benefícios deferidos na hora em favor das pessoas em situação de rua, garantindo sua cidadania, além da humanização, cuidado e acolhida com essas pessoas através dos voluntários”, avaliou o coordenador do Serviço Especializado para Pessoas em Situação de rua de São Luís, José Marques.
A Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Maranhão (ARPEN) participou do movimento oferecendo com serviços cartorários por meio dos Cartórios de Registro Civil da capital. A presidente da associação, Gabriella Caminha, informou que a entidade promoveu uma campanha de arrecadação, que contou com a participação de delegatários do serviço extrajudicial de todo o estado, sendo o valor revertido em compras de materiais de higiene que foram distribuídos às pessoas em situação de rua. “Pudemos presenciar o registro tardio da mulher Marlene Martins Araujo, de 50 anos, que nunca teve sua certidão de nascimento e foi possível realizar o procedimento”, informou.
PARCEIROS
Além do Tribunal de Justiça do Maranhão, Justiça Federal e Defensoria Pública Estadual, o mutirão conta com a parceria da Defensoria Pública da União no Estado do Maranhão; Procuradoria Geral Federal/AGU; Instituto Nacional do Seguro Social – INSS; Corregedoria Geral da Justiça; Secretaria Municipal de Saúde (SEMUS); Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte (SMTT); Secretaria Estadual de Saúde (SES); Viva/Procon; Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMCAS); Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social (SEDES); Tribunal Regional Eleitoral; Caixa Econômica Federal; Secretaria Estadual de Segurança Pública; Banco de Alimentos; Procuradoria da União; Cartórios de Registro Civil; Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA); Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (ADRA/MA); Unidade de Monitoramento Carcerário (UMF/TJMA); Instituto de Identificação do Maranhão (IDENT); Movimento Vidas Idosas Importam; Movimento Nacional da População em Situação de Rua do Maranhão; Movimento Popular de Lutas Urbanas; Igreja Batista do Olho D’água; RBC Ações e Eventos (Bombeiros Civil); ARPEN/MA (Associação dos Registradores Civis das Pessoas Naturais do Maranhão) e Associação das Defensoras e dos Defensores Públicos do Estado do Maranhão (ADPEMA).
POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA
Dados do Instituto de Pesquisa e Estatística (IPEA) registraram 220 mil pessoas em situação de rua em 2020, situação que se agravou durante a pandemia e acirrou ainda mais as desigualdades sociais, somado a outras dificuldades como os níveis educacionais e a exclusão digital.
Na capital maranhense, de acordo com dados do sistema E-SUS atualizados até maio deste ano, mais de mil pessoas vivem atualmente em situação de rua.
A iniciativa de criação dos Comitês e promoção de mutirões segue os princípios e diretrizes estabelecidos pela Resolução Nº 425/2021, que institui, no âmbito do Poder Judiciário, a Política Nacional Judicial de Atenção a Pessoas em Situação de Rua e suas interseccionalidades.
A Política tem como princípios o respeito à dignidade da pessoa humana; a não-criminalização das pessoas em situação de rua; a promoção do acesso aos direitos de cidadania e às políticas públicas; respeito à autonomia das pessoas em situação de rua ou com trajetória de rua e seu reconhecimento como sujeitos de direito, a quem deve ser assegurada sua participação nos processos decisórios sobre sua própria vida e questões coletivas a elas pertinentes; inafastabilidade do acesso à jurisdição de pessoas em situação de rua em função da exclusão digital, falta de identificação civil, ausência de documentos públicos, ausência de residência fixa, dificuldade de comunicação e tratamento burocratizado; entre outros.